30/11/2010

Peer Gynt, de Edvard Grieg (1876)

A extraordinária história de Peer Gynt é narrada numa peça teatral do premiado Ibsen, para a qual Grieg criou uma série de músicas de cena, que mais tarde viria a elaborar na forma de duas suites, de quatro trechos cada uma.

Vale a pena ouvi-las, ao passo que se conhece a história a que se referem, que pode ser assim resumida:

Peer Gynt é um jovem caçador que recebe de sua mãe Aase a notícia do casamento de Ingrid, a rapariga mais bela da aldeia. De caminho para impedir as núpcias, encontra uma outra rapariga, Solveig, com quem dança e de quem se apaixona, esquecendo Ingrid momentaneamente. Mas, ao toque dos sinos, lembra-se de Ingrid e dirige-se à Igreja, impede o casamento e fuge com a noiva, mas só dois dias depois irá deixá-la, já cansado dela.

De novo, um toque de sinos, desta vez fúnebre, fá-lo regressar. Apercebe-se que a mãe, Aase, está prestes a morrer. Ao cuidado dela está Solveig, que lhe promete ficar à sua espera para sempre, uma vez que Peer se vê forçado a fugir da justiça pelo rapto de Ingrid.

Em Marrocos, onde foge, torna-se rico e casa com uma mulher árabe, que mais tarde lhe irá roubar todos os seus bens e, quando se vê idoso, pobre e falhado, decide regressar à sua aldeia.

Na velha cabana, ouve alguém a cantar e vê o nome dele escrito na névoa dum vidro. Solveig está à sua espera, como prometera, e a sua vida é abraçada e amada acima dos seus erros e falhanços.

17/11/2010

O demónio (The Devil)

Drew e John E. Dowdle, 2010

Night Shyamalam é conhecido por filmes como A vila, O Sexto Sentido ou Signs. Não esconde a sua ligação com Alfred Hitchcock, e como este tem por hábito aparecer como figurante em todos os seus filmes, e sobre tudo criar situações de suspense que levam ao limite a tensão narrativa.

Desta mente genial, nasce um thriller classificado como «sobrenatural». A pesar da mentalidade racionalista que pretende banir certas noções como esta, é com grande naturalidade que Shyamalam mostra nas suas criações como o mistério e a maravilha fazem parte do nosso mundo: o que é aparentemente inexplicável, na realidade, é a força que domina o nosso dia-a-dia.

O trailer deste filme anuncia: «Em qualquer dia normal, as nossas vidas estão cheias de encontros fortuitos e de acontecimentos aleatórios, mas hoje tudo se passa por uma razão». Assim, cinco pessoas, que não se conhecem e que ficam presas num elevador (aparentemente) por acaso, serão confrontadas com escolhas radicais e terão de enfrentar aquilo que realmente são.

Tecendo esta história, um narrador introduz-nos num conto tradicional, que dá o seu sentido mais profundo e que nos deixa, uma vez que recuperamos o fôlego da acelerada narração, muito para pensar. Com uma mensagem de esperança: a fe e o perdão são capazes de vencer o mal.

09/11/2010

A festa de Babette (Babettes gæstebud)

Gabriel Axel (1987)

Tantas vezes ouvimos quem diga: «se eu ganhasse os Euromilhões, mudava vida: fazia tal e tal...». Pois bem, o centro a história deste filme é o que a sua protagonista vai fazer com um bilhete de loteria premiado: ficar exactamente onde está e como está, só que ainda mais empenhada nas suas circunstâncias do que antes.

O contexto é uma aldeia minúscula da Jutlândia, onde duas irmãs luteranas comprometidas na actividade caritativa promovem uma seita fundada pelo defunto pai: uma comunidade cada vez mais reduzida e envelhecida. Em contraste, vários homens que as cortejam, sem sucesso, e a «papista» Babette, personagens que introduzem uma vida diferente nessa comunidade.

A festa que Babette organiza é um manjar, onde essas posições virão à tona: o moralismo e a frustração, baseados numa recordação piedosa do defunto fundador; frente ao gosto da vida nas coisas singelas, no aproveitamento dos talentos que o próprio Deus deu ao criar cada homem e mulher.

A ironia do filme é genial, e assegura algumas gargalhadas, para além dum tom geral bem disposto.

02/11/2010

Grandes esperanças (Great expectations)

Alfonso Cuarón (1998)

Qual é o peso da herança na vida duma pessoa? Quer em termos economicos, quer em termos humanos, a pergunta é de difícil resposta.

Na história de Finn Bell, jovem pescador da Florida, as suas heranças são várias, mas não parece que lhe irão trazer as «grandes esperanças» que prometeram. Por uma parte, terá a oportunidade de passar o seu tempo com a menina mais rica do lugar, da qual se apaixona, mas a mãe dela, abandonada no dia do seu casamento, vai empenhar-se em que o coração deste jovem se parta. Por outra parte, receberá dum anónimo benfeitor grandes quantidades de dinheiro e a possibilidade de expor as suas pinturas numa galeria de Nova Iorque.

Cresce a ambição, herdada dos seus misteriosos benfeitores, e um certo sucesso aparente; mas perde-se a sua humanidade, aquilo que é genuino.

Com banda sonora de Patrick Doyle, chamativo vestuário constantemente verde e interpretações excelentes de Ethan Hawke e Gwyneth Paltrow no apogeu das suas carreiras, resulta bem esta adaptação muito livre do homômino romance de Dickens.