24/02/2010

Clair de lune, de Claude Debussy (1890)

Ouvir «Só a Beleza pode mudar o coração do homem. Na Quaresma é-nos pedido que nos deixemos comover pela presença de Aquele que é a Beleza, a Verdade e a Bondade. Não se trata de um exercício de New Age, procurar uma qualquer paz interior ou harmonia com o cosmos... mas de reconhecê-lo presente e reconhecer o seu abraço à nossa vida.

A delicada música do «Luar» da Suite Bergamasque de Debussy é uma obra da sua juventude, que ele tentou não publicar, dado que a considerava uma obra imatura.

A peça já não soa como deveu soar lá quando foi composta, momento em que quebrava laços com a harmonia tradicional, deixando de ligar dois ou mais sons simultâneos, e inventando novas formas neste ramo da música. Junto com alguns efeitos obtidos com os pedais do piano torna esta música etérea, vaporosa, onírica e ao mesmo tempo duma beleza indiscutível.

Debussy enquadra-se na corrente do impressionismo francês de finais do século XIX e princípios do XX, do qual a peça é um genial exemplo.

(Comentário por Ángel Cebolla)

18/02/2010

Um homem sério (A serious man)

Joel e Ethan Cohen (2009)

Talvez seja o filme mais cínico dos últimos tempos. Politicamente incorrecto, anti-semita e, no fundo, absurdo, é um filme que só se pode ver considerando estas premissas. Não certamente pela sua mensagem.

Dito isto, um espectador inteligente poderá rir às gargalhadas se souber captar o humorismo cáustico dos realizadores Cohen. Se for capaz de suspender as categorias naturais da sua razão, a falta de relação causa-efeito dos eventos apresentados produzirá sem dúvida um divertimento singular.

Fazendo troça do «discurso religioso», o filme põe em evidência que não é pelas fórmulas ou pelas palavras que uma experiência se torna verdadeira. Mas, insisto, não é pelos seus temas que o filme se deixa ver, mas sim pela hilariante sucessão de sem sentidos, levada até limites insuspeitos.

16/02/2010

A ponte de San Luis Rey (The bridge of San Luis Rey), de Thornton Wilder

Lisboa: Difel, 1990 (1927), pp. 120, 6,00€

Uma ponte de cordas parte-se numa colónia espanhola do Perú, no dia 20 de Julho de 1714. Cinco pessoas que a atravessavam morrem. Frei Junípero, frade franciscano italiano em missão, coloca uma questão intemporal: «Porque aqueles cinco?»

Thornton Wilder (1897-1975), aclamado novelista e dramaturgo americano, ganhou um Pulitzer por este romance, para além de outros dois por peças teatrais. Porque essa pergunta que coloca surge diante de qualquer tragédia, natural ou de ordem humana, por pequena que seja.

«Há uma direcção ou significado na vida para além da vontade do indivíduo?», questiona uma personagem. A esta pergunta tenta responder o romance, que decorre desde uma primeira parte titulada: «Talvez um acidente», até à quinta titulada: «Talvez uma intenção».

Este «talvez» declina-se na investigação sobre as vidas daqueles cinco: uma Marquesa e a sua criada, um de dois irmãos gémeos, um homem de letras reformado e o filho duma actriz famosa. Ao leitor, a última tomada de posição diante dos factos.

06/02/2010

Guernica, de Pablo Picasso (1937)

Guernica, no País Basco, conta hoje com uns 18 mil habitantes e é uma comum cidade dessa região espanhola. Mas a sua fama deve-se principalmente a este quadro de Picasso, que a imortalizou, interpretando nele os horrores da Guerra Civil Espanhola.

De facto, Guernica foi bombardeada durante essa guerra, por parte dos alemães da Legião Cóndor, curiosamente em desobediência ao mando militar franquista do Geral Mola. Contaram-se nessa acção bélica 120 mortos, segundo a investigação consolidada de J. Salas, contra a propaganda das esquerdas liderada por Preston ou Blanco, que «mataram» em Guernica entre 1.500 e 1.700 pessoas.

Picasso, simpatizante da República e antifranquista, representa neste impressionante painel a preto e branco um episodio simbolicamente catastrófico para a sua causa, embora não dos mais terríveis. As figuras desfeitas, os gritos surdos e a dor, porém, são ambiguamente contrapostas a uma luz que deixa entrever a esperança última que sempre guia ao artista sincero.

A obra pode ser contemplada no Museu de Arte Contemporânea Rainha Sofia em Madrid. Pelas suas enormes dimensões e características artísticas, a seguir ao Prado é um must numa visita à capital espanhola.