30/05/2011

Bodas de sangue (Bodas de sangre), de Federico García Lorca

Pinheiros: Peixoto Neto 2003 (1933), pp. 89, 13,00€

O teatro de García Lorca, provavelmente o maior dramaturgo de língua espanhola do século XX, tem várias constantes que o tornam a um tempo delicado, profundo e quase mítico. São estas a concepção trágica da existência, a abordagem das «grandes questões» (amor, morte, sofrimento) e a sua linguagem simples e popular.

Para além das considerações ideológicas relativas às orientações políticas ou até sexuais do autor, é impossível não reconhecer o seu génio artístico e criativo. A descrição dum mundo fechado em si próprio, onde as forças do instinto e das paixões humanas lutam por encontrar vias de escape, leva inevitavelmente a uma crise, geralmente purificadora, na forma teatral da tragédia. Podemos encontrar elementos semelhantes no teatro de Ibsen ou de Tennessee Williams.

Em Bodas de sangue, o próprio título apresenta o resumo da acção: um noivo e uma noiva, e as respectivas famílias, combinam e preparam-se para a celebração deste casamento banhado pelo sangue. Velhas paixões vencem a razão («pregos de lua fundem a minha cintura e o teu quadril»); e o destino faz justiça («tapados com dois cobertores vêm eles / sobre as costas dos altos rapazes»).

12/05/2011

Elephant

Guus Van Sant, 2003

Como é que é possível focar a delicadeza humana ao filmar um massacre num liceu americano, numa livre adaptação dos famosos assassinatos de Columbine? Parece impossível, mas o realizador Van Sant consegue fazê-lo com grande habilidade e maestria. Sobre tudo, fixando pormenores da vida quotidiana dos adolescentes de uma escola, dos seus comportamentos sociais e individuais, da sua incapacidade última de adaptar-se ao meio envolvente, da beleza de corpos, espaços, luzes, cores e contrastes.

As cenas, por vezes meditativas e genialmente entrelaçadas, não só mostram ao espectador esse dia-a-dia, mas também estão filmadas de maneira a fazê-lo entrar dentro das paredes dessa escola, como se fosse mais um adolescente desnorteado. É principalmente pelo meio dos travellings (câmaras que seguem as personagens) que parece que acompanhamos esta dúzia de jovens, literalmente escolhidos num casting improvisado num liceu.

A tensão narrativa é igualmente genial. Apesar de um ritmo pausado, sabemos desde o início que um ou alguns dos miúdos que vemos vão assassinar os outros. Por isso, perante a simpatia que por eles nasce quase espontânea, emerge também a pergunta chave do filme: porque é que se pode chegar a destruir essa humanidade com um acto tão desumano?